sábado, 25 de abril de 2009

A Demanda da Santa CAL

Trazendo a nossa memória a vetusta história, e fazendo uma paráfrase da nossa visita à Fazenda da Cal, com “A Demanda do Santo Graal” que é a mais famosa novela de cavalaria a integrar o ciclo arturiano, conjunto de textos em verso ou em prosa que se ocupam da personagem do rei Arthur, seus cavaleiros e a Távola Redonda. Merlin, Lancelote, Tristão e outras figuras lendárias integram a fantástica narrativa da busca pelo Cálice Sagrado isto é, o vaso onde fora recolhido o sangue de Cristo na cruz e que, segundo a lenda, Jesus teria usado na última ceia com seus discípulos, símbolo da comunhão derradeira e definitiva entre Deus e os homens. Desde então, o cálice passou a significar também um lance doloroso e, com 'A Demanda do Santo Graal', seus significados ampliam-se de tal maneira que tudo aquilo que nos fascina, transforma e alimenta por um momento breve – deixando um gostinho de 'quero mais' – pode ser comparado ao Graal.

E foi exatamente isso que permeou nosso sentimento quando realizamos aquela visita a Fazenda da Cal do Parceiro Sr. “Santo” Cecílio, na última 3ª feira (14/04) com mais de 30 “cavaleiros produtores”, assentados em 7 veículos, rompendo com fé e destreza uma íngreme, estreita e escorregadia estrada.

A localização da fazenda é logo depois de S.José da Vitoria, (2 Km), via BR-101, entrando á direita sentido Sul, em ramal de terra e pedras por cerca de 3-4 km.

O Sr Cecílio é um pernambucano, extremamente simpático, com amplo e sincero sorriso estampado no alto dos seus 73 anos de idade e um vigor invejável, é um verdadeiro entusiasta do cacau, realmente um produtor rural que faz jus a sua luta e a essa expressão.

O que pudemos observar na lavoura foi algo bastante peculiar a nossa atual realidade. Plantas depauperadas, estado vegetativo precário, ataques de pragas (Monalonion), e podridão (Phytophthora) mas extremamente carregadas. Nesse ponto ocorre realmente um FENÔMENO, que foge aos padrões atuais da nossa região: ”Flores desde os troncos até os galhos... cocos de cacau amarelos, cor de ouro... não há nada mais bonito no mundo que uma roça de cacau quando os cocos estão de vez, amarelos, iluminando a sombra das árvores”. (AMADO, Jorge in São Jorge dos Ilhéus, p 78). Isso, em início do mês de abril, nos impressiona, salta aos olhos tamanha pujança! Nos deixa embasbacados, realmente estupefatos, pasmos ao ver tanto cacau!!! Em qualquer ponto da roça, totalmente homogênea, esse quadro se repete. Predomina os cultivares de cacau comum, (parazinho), mas há também muitos híbridos e clones.

O Sr. Cecílio é meeiro há dois anos, e o único trato cultural que foi dado na roça, foi a roçagem e a desbrota muitas vezes á machado. Existem áreas bem sombreadas e outras mais arejadas. O relevo da fazenda é ondulado, a forte ondulado, com colinas de topo arredondado, vertentes côncavas de dezenas de metros e vales em “V” aberto, com pequena erosão laminar e solos com aparência a bruno acinzentado muito escuro, franco arenoso; estrutura fraca a moderada, muito pequena a pequena granular, com presença de grãos lavados de areia; friável, plástico e pegajoso; terra boa, fértil, e sem necessidade de calagem. No entanto, o uso de um solo fértil nem sempre implica em alta produtividade, pois esta é resultante da interação de vários fatores, inerentes á planta, ao clima, ao solo e às condições de manejo. Identificam-se 54 fatores que, em conjunto, determinam a produtividade. A produção poderá ser limitada em solos férteis com impedimentos físicos, que provocam restrições ao transporte dos nutrientes e ao desenvolvimento do sistema radicular. No entanto, um solo produtivo deve apresentar fertilidade elevada, ou ter sido, previamente, corrigido, o que não ocorreu nos solos do Sr. Cecílio, pelo menos a mais de 10 anos, sem um grama sequer de fertilizante. Ele mostrou-me a recente Análise de Solo, onde prescinde a necessidade de calagem.

Ele nos relatou que no primeiro ano (2007) colheu pouco mais de 200@, no 2º ano (2008) mais de 600@ e certamente só no atual temporão colherá mais de 600@! Seguramente, a confirmar-se a eficácia do método, e se não houver outros fatores contrários, ultrapassará as mil @ neste ano (2009). Ele faz duas aplicações anuais de Cal (CaO) hidratado, por ocasião dos lançamentos de março e setembro. Pudemos observar vassouras em ramos em estágio verde e seco, sem agressividade aparente e apenas uma esporulando. Alguns frutos atacados pela VB, mas quase nenhum “morango”. Muito pouco, principalmente em comparação com a vizinhança, onde os pés estão sem carga e com forte ataque do fungo (Moniliopthora perniciosa).

O que presenciamos foi resultado do trabalho, esforço insistente e totalmente empírico de um singelo operário do cacau. Ele disse: “uma luz divina me iluminou”!

Convém salientar que a fazenda apresenta um quadro de precariedade, e que segundo o Sr, Cecílio, estava condenada ao abandono e a desinformação e que ele mesmo estava quase desistindo do cacau quando recebeu a iluminação de Deus, fazendo-o recordar-se das práticas antisépticas utilizadas na lavoura da cana-de-açúcar em Pernambuco. A aplicação da Cal vai assegurar a produção e níveis de produtividade compensadoras, haja visto seu baixo custo (R$0,60 o kg). Custos operacionais com gasolina, óleo 2 Tempos, mão-de-obra, manutenção dos motores e EPI(Equipamento de Proteção Individual). Um operário aplica por dia, tranqüilamente, 15 a 20 ha e com a ajuda do vento, melhor ainda. Cremos que o principal mérito da nova técnica, reside no fato de que está acessível ao produtor e constitui-se num salto qualitativo que certamente representará um esforço de qualificação da lavoura e quiçá, a derrota da insidiosa VB que nos assedia tenazmente. Outro fator extremamente relevante é que não é agrotóxico, não há preocupação com resíduos para o homem e a natureza. O Sr. Cecílio não apenas inovou em termos de práticas agrícolas, mas também no que significa em termos de racionalidade técnica, econômica e ecológica, imprimida à lavoura atendendo à crescente exigência por produtos mais naturais. Confesso que havia certo ceticismo de minha parte quanto à quantidade aparentemente ínfima da Cal,(8 kg/ha), mas ao presenciar a aplicação, pude ver seu efeito alastrador imediato. Outro fato que levantou dúvidas entre os visitantes foi a eficácia e função da Cal, na cultura do cacau, e pude contribuir com os inquiridores explicando que tal produto é amplamente utilizado como base da Calda Bordalesa, que é um tradicional fungicida agrícola, resultado da mistura simples de sulfato de cobre, cal hidratada ou cal virgem e água.Tem eficiência comprovada sobre numerosas doenças fúngicas da videira, caquizeiro, citros e de outros cultivos. Possui também ação contra bactérias e determinadas pragas. Eu próprio já apliquei bastante na lavoura do cacau, como fungicida, contra a Podridão Parda (Phytophthora) além de ser aplicada como anti-séptico contra o Mal-de-facão (Ceratocystis cacaofunesta).

A aplicação do Sr. Cecílio é extremamente simples: A motobomba é preenchida com cal hidratado - Hidróxido de Cálcio usado para a construção - e pulverizada sobre toda a roça em uma proporção de aproximadamente 3 kg por tarefa, ou 8 kg por ha. Como não há nenhum adesivo, a maior parte dessa cal é lavada com bastante rapidez, embora tenha sido possível verificar em vários frutos que os mesmos estavam cobertos com essa "poeira" de cal. A cal que ele usa na roça é o hidróxido de cálcio, ou cal hidratado. A cal propriamente é o oxido de cálcio, CaO, fórmula que levou à popular Cal, com L. Esse CaO, quando combinado com a água, H2O, leva a formação do hidróxido de cálcio, Ca (OH)2, o qual, ao entrar em contato com a água, dissocia em OH- levando a uma alcalinização imediata. Essa é uma situação diferente da do calcário, que tem predominantemente o carbonato de cálcio, CaCO3, que é em princípio neutro, tendo a sua alcalinização lentamente, com trocas de carga no solo. Portanto, temos que levar em consideração que a Cal tem um efeito imediato na alcalinização, ou seja, na redução da acidez.

A Ceplac não pode ficar na cômoda posição de mera expectadora. A Ceplac deve mobilizar-se, testar, experimentar e tomar parte nos riscos. Cabe a Ceplac assimilar a relevância.

Em Camacan houve uma corrida em busca da Cal, esgotando todo o estoque da cidade em poucas horas e as oficinas de conserto de motores encontram-se repletas de serviço!

Foi muito gratificante ver o entusiasmo nos rostos dos visitantes O Romildo Fernandes, bastante eufórico, nos fez lembrar mais uma passagem do romance “São Jorge dos Ilhéus, do nosso AMADO Jorge: “era o grito que João Magalhães soltara quando, ao chegar de Ilhéus saltou do cavalo na porta da roça... Don’Ana, vamos enriquecer de novo!

Aqui não poderia olvidar de tecer um parágrafo em atenção especial ao Paulo Cortizo que mesmo tendo um vizinho aplicando a nova técnica, ficou sabendo através do seu Barbeiro em Buerarema e não se absteve em divulgar ao máximo, inclusive distribuindo um CD (que demonstra a novidade), de maneira totalmente abnegada e altruísta! A atitude e o desprendimento de Paulo Cortizo, coaduna perfeitamente com a frase de Albert Schweitzer que disse: “Só serão realmente felizes os que procuram e encontram um meio de servir”.A Bíblia também nos diz: “Lança o teu pão sobre as águas, porque depois de muitos dias o acharás” (Eclesiastes 11.1). Isso significa claramente uma lei espiritual, a lei do retorno! Tudo volta até nós. Muita coisa na vida é fruto das nossas escolhas e atitudes. E entre atitudes que trazem coisas boas, está dividir o que se possui, ajudando aos outros quando for possível, pois na matemática espiritual e emocional, quem divide, multiplica! Precisamos perceber - e talvez esse mal (egoísmo e individualidade), seja pior que a vassoura-de-bruxa – que o único meio de multiplicar a felicidade é dividindo-a! Ninguém cresce sozinho, o crescimento é mútuo, na proporção que eu ajudo também sou ajudado. Por causa da Lei da reciprocidade, as pessoas egoístas já estão sentenciadas à autodestruição. Sêneca disse: ”Se me oferecessem sabedoria, com a condição de guardá-la só pra mim, sem comunicar a ninguém, não a quereria.”

Certamente a visita á Fazenda da Cal foi um bálsamo ao meu espírito quebrantado e árido e um colírio aos meus olhos ver tanto cacau! E foi bem aprazível e mais fácil caminhar com pessoas abnegadas, altruístas como o Sr. Cecílio e Paulo Cortizo.

Mesmo conscientes da fragilidade das nossas teorias, em toda sua singeleza e aspectos de sua dinamicidade, achamos que Vale a pena!!!

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Antônio Walter de Oliveira Rocha Júnior

Engº. Agrônomo

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"Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro, e depois perdem o dinheiro para a recuperar. Por pensarem ansiosamente no futuro, esquecem o presente, de tal forma que acabam por nem viver no presente nem no futuro.
Vivem como se nunca fossem morrer e morrem como se não tivessem vivido..." (Confúcio)

Obrigado pela visita!